quarta-feira

AS CARTEIRAS CONTINUAM IGUAIS



Em um dos primeiros dias de estágio em uma escola estadual da cidade de Arujá – SP, observei algo muito interessante, que por sua vez me fez refletir sobre outras questões. Sentado em uma carteira, na qual eu ficava visivelmente deslocado, por ser um pouco grande demais para ela, percebi que eram as mesmas carteiras usadas na minha época do ensino fundamental, isso há 13 anos atrás. Que por sinal eram as mesmas carteiras (me refiro as mesmas na questão do formato e modelo) da época de escola da minha irmã, isso há 25 anos atrás.

Comecei a reparar que toda a estrutura física da escola permaneceu intocável. Claro, as salas foram pintadas, o pátio teve um piso novo, mas a cara, o formato, permaneceu intocável (com mais cara de presídio do que de escola). Ponderei na seguinte questão: Se temos dificuldade para mudar o ambiente físico, quão mais dificultoso e demorado seriam as mudanças conceituais que provém de uma estrutura que não é muitas vezes palpável?

Fácil é mudar a estrutura, difícil é mudar a cultura. Mas se não mudamos, ou não investimos nem um pouco em uma mudança estrutural, provavelmente o movimento de mudar a questão cultural está muito aquém do que deveria.

A escola é repintada, a apostila remodelada, as carteiras são recauchutadas, mas a cultura, a mente continua a mesma. O processo permanece igual, a mentalidade, o conceito permanece com pouca ou nenhuma alteração, diante de uma sociedade que se altera constantemente.

Sei que já é algo comum, mas não deveria ser, alunos de sexta série não sabem ler e escrever (isso não é nenhuma hipérbole) imagine interpretar um texto ou o contexto. Percebi que em uma das salas que visitei, um em cada três alunos sabia escrever e interpretar o que tinha sido pedido nas provas, os outros dois tinham dificuldades até de escrever o nome no cabeçalho e por aí vai.

Percebi que muitos alunos querem aprender e muitos professores abraçam a vocação e querem realmente ensinar. Mas alguma coisa nesse meio de campo trava o crescimento desse desejo. Às vezes penso temerosamente que essa perversidade é proposital, como se escola estadual servisse apenas para formar mão de obra barata (afinal alguém tem que trabalhar pesado nesse país). Pois se um aluno chega na sexta, sétima ou oitava série sem saber ler e escrever, dificilmente ganhará gosto por isso nas séries seguintes. O sistema vai passando pra frente e todos sabem que na sociedade de hoje quem não sabe ler e escrever, dificilmente galga uma posição que possa lhe conceder um pouco mais de tranqüilidade na vida.

Não podemos deixar de apontar para a injustiça que a própria educação oferecida pelo governo gera. Conheço crianças de 9 anos que além de saber escrever e ler já sabem até falar inglês. Algumas (bem poucas) são de escola estadual e pública, a maioria de escolas privadas.Inteligência não é apenas uma questão de gene e estrutura familiar, mas também de incentivo e preparo.

Talvez você não sinta tão forte essa realidade, pois não presenciou uma sala de sexta série da escola estadual de um bairro pobre. Desafio você a passar por uma. Fique tranqüilo, você não vai se perder, ela continua igual ao seu tempo de colégio (se é que você estudou em um colégio desses), passe lá e você verá que as carteiras continuam iguais.

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